Abolição da Lei Áurea ficou só no papel. Sem reparação, sem trabalho, sem moradia, sem educação, sem condições dignas de vida, negros e negras foram mantidos às margens da sociedade
O dia 13 de maio ainda é celebrado oficialmente como o Dia da Abolição da escravidão no Brasil. No entanto, não é assim que a data é marcada pelo movimento negro e por todos que lutam contra a opressão racista. O dia de hoje marca o Dia Nacional de Luta contra o Racismo.
Não comemoramos a assinatura da Lei Áurea pela princesa Isabel, no dia 13 de maio de 1888, como um marco do fim da escravidão. Primeiro, porque a assinatura dessa lei não foi um “presente” da monarquia, como as classes dominantes tentam fazer parecer. Essa ideia, na prática, visa apagar da história a luta feroz que negros e negras protagonizaram pela sua liberdade, durante a escravidão e até os dias de hoje.
Uma luta que se deu através da existência dos quilombos, de revoltas, rebeliões, fugas em massa, sabotagens nas plantações e diversos outras formas de enfrentamento e resistência. Uma luta que teve lideranças como Zumbi dos Palmares e Dandara; as revoltas das Carrancas, em Minas Gerais, dos Malês, na Bahia, da Balaiada, no Maranhão, e muitas outras, que desafiaram e enfrentaram as classes dominantes.
Em segundo lugar, o 13 de maio não é reivindicado como o dia da abolição, pelo simples motivo que a assinatura da Lei Áurea foi uma formalidade, ocorrida quando o regime escravocrata já se encontrava enfraquecido e, mais do que isso, não significou a verdadeira liberdade de negros e negras.
Sem reparação, sem trabalho, sem moradia, sem educação, sem condições dignas de vida, negros e negras foram mantidos às margens da sociedade. Os escravos foram tirados das senzalas e jogados nas favelas, periferias e presídios. Uma situação que, 136 anos depois, perpetua a exploração e a discriminação racista.
É assim que negros e negras seguem sendo maioria nas estatísticas do desemprego, da desigualdade salarial, do trabalho precário e sem direitos, da fome e da pobreza, da falta de acesso à saúde, educação e moradia, da violência e das mortes no país. Nesse quadro, inclusive, as mulheres negras estão na base da pirâmide social. Basta conferir as mais recentes pesquisas.
Outro dois aspectos também confirmam a farsa da abolição no Brasil. A chamada “escravidão moderna” e a violência policial, que violenta, mata e encarcera em massa a população negra.
Em 2023, o Brasil contabilizou 3.151 trabalhadores resgatados em condições análogas à escravidão. São trabalhadores encontrados em situações como trabalho forçado, de servidão por dívida, em condições degradantes ou jornada exaustiva. Foi o maior número de resgates de 2009. Desde 1995, foram 63.400 pessoas nessas condições, segundo dados do Ministério do Trabalho. A maioria são negros e negras.
Já a violência policial também tem raça e classe. Negros são o alvo preferencial. Em 2022, a cada 100 mortos pela polícia em oito estados brasileiros 65 eram negros, segundo o estudo “Pele alvo: a bala não erra o negro”, da Rede de Observatórios de Segurança, do Cesec (Centro de Estudos de Segurança e Cidadania). Uma violência que se dá nas periferias e comunidades pobres em todo o país.
Exigimos uma verdadeira abolição. Reparações, já!
Foram mais de 300 anos de escravidão e 136 anos de uma abolição incompleta que impuseram e ainda impõem desigualdades, violências e discriminação racista até hoje. O fato é que o capitalismo segue se utilizando do racismo para impor uma superexploração e obter lucros.
Por tudo isso, o 13 de Maio é uma data para denunciar a farsa da abolição, combater o racismo e também exigir reparações históricas.
Recentemente, o presidente de Portugal admitiu publicamente que seu país tem de pagar os custos pela escravidão e pelos crimes cometidos no período colonial. Portugal foi o país europeu que mais traficou africanos. Dos mais de 12 milhões de negros sequestrados da África, quase 6 milhões foram traficados pelo país, então uma potência econômica e militar na época. O país foi também um das principais potências que colonizaram e roubaram a riqueza de diversos países, dizimando também povos indígenas e populações locais. A fala do presidente português, contudo, não foi seguida de uma proposta concreta para efetivar essa reparação.
É necessário uma política de reparação séria e estrutural, que combata as desigualdades sociais e étnico-raciais, como a apresentada pelo Quilombo Raça e Classe (confira aqui), no processo contra o Banco de Brasil.
Reparações que venham com medidas como a titulação de terras quilombolas, a demarcação imediata das terras indígenas, com garantia e igualdade de direitos à moradia, educação, saúde, creches, empregos, salários; o fim da violência e do racismo da PM contra negros e negras, a revogação de todas as reformas e medidas que atacam direitos, entre outras.
Acima de tudo, reafirmamos com dizia Malcom X: “não há capitalismo, sem racismo”. Portanto, lutemos pelo fim deste sistema opressor e racista!